13/02/2015

Professores mantêm acampamento no Centro Cívico no 5º dia de greve
Nem a chuva afastou os
educadores do “quintal” do governo estadual. Pressão do funcionalismo
público colaborou para a retirada do "pacotaço" que tramitava na
Assembleia
A sexta-feira (13) amanheceu diferente no Centro Cívico, em
Curitiba. Depois de dois dias de ocupação da Assembleia Legislativa do
Paraná (Alep) e da pressão que retirou da pauta da casa um "pacotaço"
que cortava benefícios do funcionalismo e ameaçava a ParanáPrevidência,
os educadores recuaram. A assembleia foi desocupada e o prédio está
fechado, apesar das falhas nos portões. A categoria, no entanto,
continua mobilizada. Muitos passaram a noite acampados na Praça Nossa
Senhora de Salete, no “quintal” do governo estadual.
O local é
estratégico, já que eles continuam à vista tanto dos deputados estaduais
quanto do alto escalão do governo, já que o Palácio Iguaçu fica a
poucos metros. Nem a chuva atrapalhou o acampamento. As barracas foram
montadas embaixo de tendas que já estavam na praça desde a última
segunda-feira (9).

pacote da discórdia
Um dia histórico, instante a instante
Se os dois dias anteriores já haviam sido totalmente atípicos na
Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), ontem o clima extrapolou
totalmente a normalidade. Com o prédio cercado por manifestantes do lado
de fora dos portões e por policiais do lado de dentro, 33 parlamentares
da base governista chegaram ao Legislativo em um veículo da tropa de
choque da PM e só conseguiram entrar após funcionários serrarem parte da
grade. Ao saber da chegada dos deputados, manifestantes avançaram
contra os policiais pela entrada principal da Assembleia, derrubando os
portões. Houve um início de confronto, com tiros de balas de borracha,
gás lacrimogênio e bombas de efeito moral. Com o recuo dos policiais, os
manifestantes cercaram o prédio onde estavam os deputados até o fim da
sessão.
Análise
Reação policial foi de alto risco para ambos os ladosA reação dos policiais contra os professores que furaram o primeiro bloqueio na entrada da Assembleia Legislativa na tarde de ontem foi uma ação de alto risco tanto para os agentes quanto para os manifestantes. De um lado, a tropa sob ordens em menor número e, do outro, milhares de professores.
Para o coordenador do Centro de Estudos da Violência e Direitos Humanos da UFPR, Pedro Bodê, porém, é preciso analisar o contexto e não a operação isolada. “A gente sempre olha a ação da PM, mas temos que olhar para quem deu a ordem de reação.”
Bodê não tira a responsabilidade da tropa, mas explica que o caso não é de segurança pública, mas político. De acordo com Bodê, o posicionamento do governador Beto Richa (PSDB) tenta tratar a manifestação como um ato de violência, colocando o episódio na Segurança Pública. “Há uma inversão do que é um ato de violência”, diz.
Operação
A resposta da PM contra os manifestantes, no entanto, poderia ter gerado prejuízos ainda piores. Segundo o ex-secretário Nacional da Segurança Pública, José Vicente da Silva, movimentos desse tamanho sem controle pode gerar pisoteamento, por exemplo.
Apesar disso, ele considerou a ação da PM correta. “Depois de a primeira linha de contenção ser ultrapassada, é preciso fazer uso da força gradual. A polícia precisava manter a ordem”, explicou. O recurso inicial, de acordo com o coronel, é técnica de dispersão com bombas de gás. Segundo ele, o trabalho pode ter reduzido danos. O uso da bala de borracha durante a ação, porém, pode ter sido exagero.
Segundo o coronel, a bala de borracha é usada para neutralizar manifestantes violentos. A reportagem que esteve no local não viu em nenhum momento professores agredirem policiais.
Lado da PM
A PM afirmou que a ação da tropa não foi agressiva e que o número de pessoas feridas é ínfimo diante do tamanho do protesto. A polícia alegou ainda que os soldados só dispararam balas de borracha e usaram sprays de pimenta porque a população avançou contra eles.
Diego Ribeiro, Rodrigo Batista e Euclides Lucas Garcia
• Cerco
Já no início da manhã manifestantes cercaram todas as entradas da
Assembleia Legislativa. Servidores da Casa foram impedidos de entrar. A
administração da Alep já havia dispensado parte dos funcionários temendo
confronto.
• Grade serrada
No início da tarde 33 deputados chegaram à Assembleia em um veículo
da tropa de choque da PM. Policiais tiveram que serrar uma grade lateral
para permitir a entrada dos parlamentares. O comando do movimento,
formado na maioria por professores, pedia o tempo todo manifestação
pacífica. Minutos após o início da sessão – mais uma vez realizada
improvisadamente no restaurante da Assembleia -, debaixo de uma forte
chuva, manifestantes derrubaram novamente os portões e avançaram sobre
os policiais.
• Balas e flores
Gás lacrimogênio, balas de borracha e bombas de efeito moral foram
lançados e dispersaram momentaneamente a multidão. Alguns ofereceram
flores aos policiais, que, aos poucos, recuaram até a entrada do prédio
administrativo da Alep. No quinto andar estavam os deputados.
• “Retira ou não sai”
Com a tomada do pátio interno pelos manifestantes, o batalhão de
choque se instalou no saguão do prédio administrativo. Fora, os
policiais militares mantinham o cordão de isolamento. “Retira ou não
sai” era o grito da multidão.
• Desespero
A deputada Cristina Silvestri (PPS), novata na Assembleia, se
assustou com os manifestantes. Queria deixar o local durante a sessão,
mas foi convencida a não sair. Quando os ânimos se acalmaram, ela e a
deputada Cantora Mara Lima (PSDB) seguiram para os gabinetes amparadas
por policiais.
• Retirada
Após o recuo do governo e a retirada do projeto, aos poucos, os
servidores deixaram o local, lembrando que a ação do governo se
assemelha muito com a que o então governador Álvaro Dias teve em 1988.
Segundos os professores, o dia 12 de fevereiro, assim como o 30 de
agosto, se transformará em um “dia de luta.”
• Socorro
Durante a tarde, alguns manifestantes se sentiram mal. Um deles
chegou a desmaiar. Todos foram atendidos por socorristas do Corpo de
Bombeiros. O saldo do dia foi de 11 feridos: seis manifestantes, por
balas de borracha, e cinco policiais.
• Gentileza
Com o dia se encerrando, professores foram cumprimentar os policiais.
“A vida deles é mais difícil do que a nossa”, disse a professora de
Francisco Beltrão Neusa Folmann. “Eles nos respeitaram e nos
protegeram”, concluiu a colega Valderês Bueno.
• Fica ou sai?
No plenário, um pequeno grupo de professores queria manter a
ocupação. No final, todos decidiram sair e acampar em frente ao Palácio
Iguaçu, sede do governo. “Tomamos chuva, horas de sol, passamos sede,
fome, mas resistimos porque acreditamos na educação”, resumiu a
professora Carla Adriana de Araújo, de Paiçandu.
• Black Blocs
Entre os que queriam ficar, a principal reivindicação real era a de
ser mais ouvidos nas decisões. “Tudo está muito verticalizado aqui”,
criticou Harethon Santos, 26 anos, professor de sociologia no colégio
Marli Azevedo, no CIC. “É uma série de movimentos que não têm prática de
constituir comando, odeiam sindicatos, partidos. São como os black
blocs e o Movimento Passe Livre”, contra-atacou o Professor Cafu,
diretor de Relações Sociais da APP.
• Selfies
Quando a situação já estava apaziguada dentro da Assembleia, os
professores e estudantes aproveitaram para tirar inúmeras ‘selfies’ nas
cadeiras dos deputados. Alguns erguiam os braços, com os punhos
cerrados, outros faziam o V da vitória com os dedos. O deputado Tadeu
Veneri (PT) foi interrompido quatro vezes durante uma entrevista por
manifestantes querendo uma foto com ele.
• Beijinho no ombro
Veneri, em conversa com o Tenente Rocha e o Major Breunig, da Polícia
Militar, reclamou da postura de alguns policiais antes da ocupação da
Assembleia. Soldados que estavam dentro do plenário foram vistos pelo
deputado fazendo o gesto de “beijinho no ombro” para os manifestantes.
• Faturamento alto
Para alguns, a chegada dos milhares de professores significou uma boa oportunidade
de negócios. Cleiton Mendes, de 31 anos, vendeu mais de dois mil
espetinhos (frango, carne bovina, suína e coração de frango), a dois
reais cada. “É a mesma quantidade que vendo em grandes festivais de
música”, afirmou. Em dias normais, comercializa cerca de 350 unidades.
• Lei Seca
“Quer tomar sua cervejinha? Pode. Mas fora do acampamento. Senão
depois temos que aguentar o pessoal falando que viemos aqui para fazer
um piquenique”, dizia uma integrante da APP ao microfone. Depois ela
pediu aos ambulantes que vendiam cerveja para saírem de perto. E
perguntou: “Precisa fazer plenária para isso?” “Nãoooooo”, foi a
resposta.

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